Estou lhe escrevendo após ouvir seu discurso na tribuna do Senado. O caso Renan e o modo como os senhores votaram revela de forma absurdamente clara que estamos em uma Guerra Civil. Curiosamente, não há na história da democracia uma guerra como a que estamos vivendo. Se observarmos nossa trajetória, essa Guerra sempre esteve anunciada nos atos eugênicos, racista e eurocêntricos de nossas elites.
Todavia nunca tivemos tanta clareza sobre essas circunstâncias. É notório que não somos um país justo, que temos questões sociais graves, um quadro de desigualdade racial vergonhoso e uma elite feroz. É igualmente verdade que o mito de que somos um povo pacífico e uma democracia racial serve a esse interesse de tornar a realidade política algo intangível para muitos de nós.
Por isso, o resultado da votação é algo que não deveria nos incomodar. Mas, é algo que nos mata. O Senado, o Congresso, a Justiça, os intelectuais, os partidos, os políticos e toda a nossa estrutura social é uma teia que captura os melhores anseios de nosso povo. Entretanto, o poder que conferimos às nossas instituições é convertido em um uso abusivo, inadequado, antidemocrático e mantenedor da violência que barbariza nossas cidades, criminalizando nossas famílias, assassinando nossos jovens e compromete nosso futuro.
Essa Guerra, a que me refiro, já é sentida a tempos pelos mais vulneráveis que vivem à margem do Estado. A dita classe média crê que amanha será tudo melhor. Já elegemos o caça corruptos, o lula lá, os neoliberais e uma série de homens e mulheres que privatizam o poder que se diz, emanar do povo.
Com todo respeito, vivemos numa ditadura elitista e civil. Um regime duro e implacável que torna a democracia e suas aspirações civilizadoras um mero sofismo. Nós o povo temos que nos convencer de que o Senado, o Congresso, os Tribunais de Justiça enfim nossa estrutura anda de forma civilizada, legal e legitima.
Sinceramente há um espetáculo de horrores em todos os cantos desse país. O Senado refletiu o jogo político que atinge todas as localidades do Brasil. Talvez estejamos cegos como propõe Saramago. Uma cegueira incomum e irreal que atinge a todos e que se constitui numa epidemia. Isso não deve ser considerado um momento histórico a ser louvado.
Vamos parar com essa coisa de conselho de ética, não sei se vocês sabem o que é ética. Ontem caro senador, vocês – estes quer votaram contra ou a favor – demonstraram que não sabem o que representa o princípio de alteridade. Não há mais legitimidade, nem legalidade que se sustente nessa lógica perversa de tratar o poder, o bem público, nossas aspirações de justiça, ordem, progresso e democracia.
Talvez eu possa passar no julgamento de muitos de vocês com um sujeito prepotente, arrogante e que se encontra de cabeça cheia. Mas, a Guerra foi declarada. Amanha vocês, eu e muitos outros vamos ver os efeitos bárbaros dessa Guerra. Alias os índices sociais revelam o que estou dizendo!
A questão é que a Guerra ainda não foi politizada e não atinge as elites e nem seus representantes. Por isso, essa dita democracia se sustenta sobre o jugo das classes populares. Mas, isso pode mudar e não se trata de uma eleição, de voto consciente e nem nada do tipo.
Não estou fazendo ameaças, mas, uma previsão de futuro. O Brasil possui um destino importante a cumprir. Superamos com civilidade os efeitos da escravidão embora não acha igualdade racial, superamos com paciência a ditadura militar, superamos com trabalho as gestões públicas corruptas e superaremos com enfrentamento os abusos que estão por vir como por exemplo; o fim do 13 salário.
Nós – o povo – menosprezado e desconsiderado haveremos de ter a dignidade que nossos políticos não possuem. E infelizmente, caro senador, isso será conquistado. Não será algo dadivoso como foi a abolição da escravidão. Hoje a impunidade protege os injustos, amanha a justiça vai cobrar seus tributos.
Ontem o Senado ameaçou minha dignidade, agrediu meu senso de justiça, rasgou a constituição, rompeu a noção de que todos são iguais perante a lei e me ameaçou de morte. O senado agiu como o déspota esclarecido que possui direito de vida e morte sobre o vassalo. Só que eu não sou um escravo nem um vassalo. E não vou procurar a polícia, nem os juízes, nem os políticos.
Portanto, esse terrorismo institucional de nossas oligarquias, esse elitismo eurocêntrico de nossos representantes deve ser combatido. Há uma figura jurídica que pressupõe que em caso extremo de ameaça à vida o sujeito pode matar seu oponente.
Não sou muito religioso, mas, que Deus ou mesmo o diabo permita que outras pessoas possam fazer uma análise como essa que estou desenvolvendo. Estamos ameaçados e podemos reagir. O senado nos esclarece, com o caso Renan, que os senadores são nossos inimigos.
A Justiça e seus representantes já deixaram isso muito claro. Afinal o código civil serve ao rico, o penal aos pobres. As outras esferas estruturais da política brasileira são também muito afirmativas quando se trata de desconsiderar a coisa pública como inerente ao bem comum.
Peço a gentileza de não considerar esse texto como uma crítica pessoal. Eu não sou eleitor a muito tempo e, embora jovem, não creio em saídas mágicas, em discursos austeros, num esquerdismo radical. Mas, gostaria de visualizar um projeto de país que possa permitir diálogos e compromissos para além, das ideologias e dos partidos.
O Senado é uma vergonha sem exceções. Porque não me parece possível nessa casa realizar algo que se contraponha ao ordenamento autoritário que rege e perpassa nossas instituições “democráticas”.
É preciso um apocalipse, mas, como não leio a bíblia proponho uma revolução.
Atenciosamente;
Ricardo Rodrigues.
Professor,
ResponderExcluirAdorei a sua carta! Aliás, adorei todos os seus escritos. Não sabia que você era poeta.
Quero dizer que aceito a sua proposta. Quando começamos?
Um abraço,
Ana Kaddoum